Eu já lhes contei sobre minha tia que é psiquiatra?
Hoje, pela tarde, ela veio visitar mamãe. Passado certo tempo, apareceu no meu quarto,fechou a porta e disse:
- Sua mãe está preocupada com você. Quer conversar?
- Huh..não.
- Quer desabafar?
- Nous.
- Aiai. Você tem feito alguma coisa pra aliviar todo esse estresse?
- Minha diversão social está restrita a um comprimido de Dramim por noite.Ela me observou com seus grandes olhos azuis(ahn, mmmmaldição que eu não puxei esse lado da família!)e fixou o olhar no único móvel que sobrou do meu quarto.(devido à doença de minha mãe, a mudança está paralisada e eu estou vivendo num estado de semi-acampamento.)
Antes que eu pudesse impedir, ela abriu a gaveta, pegou os comprimidos e jogou pela janela do apartamento.
- Mas.. mas.. isso nem vicia!E agora, como é que fica minha insônia!?!?!
- Isso vai acabar com teu fígado, isso sim. Se quiser um anti-depressivo que preste, toma este aqui, eu tenho uma caixa na bolsa.
- Ah tia, valeu.
- Querida, você nem imagina a merda que me foi esse último mês.
- Opa, quer desafabar? Uma hora é cem reau.
- Cem reais é o preço desse remédio que eu te dei, ingrata!No começo desse mês, eu estava voltando do manicômio às onze horas da noite(esqueci de lhes acrescentar, ela trabalha num manicômio judiciário)
e você sabe que eu só ando acima de 100 km/h nessas ruas de noite. Pois bem, quando eu entrei numa avenida, um bêbado de bicicleta cortou a rua na contramão, sapecou no pára-brisa, deu uma cambalhota por cima do capô e caiu estatelado a uns cinco metros do calçamento.
- Amassou o carro?
- Amassou foi o homem todo! Eu desci do carro desesperada, deu um chute nele de leve pra ver se ele acordava, tentei sentir o pulso, e nada! Foi aí que um senhor que estava do outro lado da rua apareceu pra falar comigo!
- Para ajudar?
- Ah, se sesse! Ele veio logo me chamando de assassina, que viu tudo, que eu atropelei de propósito, um horror!
- E aí?
- E aí eu mandei ir se f(piiiii), que fosse pra p(piiii) que o pariu, chamei ele de c(pii)zão, peguei o bêbado, arrastei até o meu carro, soquei no porta-malas e sumi dali.(a tempo, essa tia pesa mais de 100kg e dá porrada até no filho mais velho que tem 1,80m)
- Jogou o corpo no mar?
- Até pensei,mas eu telefonei pro teu tio(que também é médico e estava dando plantão num hospital )
e disse que estava levando o bêbado atropelado para lá.
- Aposto que você pensou que, se ele morresse, seria mais fácil colocar como indigente, né.
- Justamente! Quando cheguei lá, comecei a chorar e disse ao seu tio que tinha matado o homem! Foi aí que aconteceu a coisa mais absurda da minha vida: enquanto eu gritava, o bêbado acordou, sentou-se na maca e ficou nos observando discutir. Quando eu falei "ele morreu!", o bêbado respondeu "Morri não, só tava dormindo. Dona, você acabou com a minha bicicleta."
- ...?É boa!
- Daí a gente batou raio-x da cabeça ao pé daquela criatura, eu o hospitalizei, paguei tudo que era medicamento e ele ficou bom em uma semana. Para não haver problema, dei outra bicicleta de presente pra ele.
- Ah, então terminou tudo bem.
- QUE NADA! Ontem mesmo, eu estava dirigindo o mesmo carro, no mesmo horário e na mesma rua e pá, atropelei um ciclista que vinha na contramão! Quando desci pra olhar, adivinha QUEM era?
- Não acredito.
- Eu fiquei com tanto ódio que comecei a chutar o infeliz e a dizer "vai, te mete logo embaixo da roda do meu carro, eu termino o serviço aqui mesmo!", mas o mesmo feladap(piii) que apareceu pra defender o bêbado da primeira vez apareceu DE NOVO e o bêbado conseguiu fugir de mim.
- Tia, acho que você está precisando desse medicamento mais do que eu.(Definitivamente, eu amo minha família.)